eventos » Campanha Doa Brasil – Mapa do Luto de Peixinhos
Conheça a campanha: https://doabrasil.net/imue
Em julho de 2019, nós do imuê – Instituto Mulheres e Economia – visitamos o Grupo Comunidade Assumindo suas Crianças (GCASC), uma organização que trabalha no contra-turno escolar com crianças e jovens de Peixinhos, Olinda, oferecendo-lhes atividades culturais e de formação política. Fundada na década de 1980 por moradores do bairro, o GCASC nasceu numa época em que os chamados “meninos de rua” se tornavam um problema de grandes proporções no país, em geral enfrentado pelas próprias comunidades a partir de pequenas organizações de base. Desde então, o GCASC se tornou um ponto de referência para crianças do bairro e suas mães. Em 2011, dentro do GCASC, nasceu o grupo Mães da Saudade de Peixinhos, um coletivo de mulheres que tiveram seus filhos assassinados. O GCASC atua como base para essas mães, fomentando o encontro destas com jovens multiplicadores, que com elas aprendem a valorizar a vida, como não cansam em dizer.
O objetivo do encontro entre as duas pesquisadoras do imuê, quatro mães da saudade, seis jovens, uma educadora e dois coordenadores do GCASC era iniciar as discussões para a elaboração conjunta do projeto “Mapa do Luto”, uma proposta já pensada há alguns anos pelo GCASC. A ideia era discutir os termos de uma possível pesquisa colaborativa com a intenção de produzir dados relevantes para embasar políticas de prevenção à violência no bairro.
Para pensarmos sobre o mapa que a gente estava ali propondo, nós precisávamos olhar para aqueles já existiam e que retratavam não o luto, mas a violência. Ao longo de uma semana debatemos os mapas de violência desenvolvidos por sociólogos com base nos dados produzidos pela Gerência de Análise Criminal e Estatística (GACE) da Secretaria de Defesa Social do Governo do Estado de Pernambuco (Sauret, 2012).
Inspiradas em projetos de contra-cartografia, começamos a pensar juntos no desenho do Mapa: como um mapa do luto produzido pela comunidade difere de um mapa da violência produzido pelo governo do estado? Que dados julgavam importante produzir para embasar políticas de prevenção à violência?
Tínhamos logo de saída uma primeira questão: a escala. Um mapa do luto mostraria uma escala para a qual o governo era cego: as regiões dentro de Peixinhos conhecidas apenas por aqueles que ali habitam. Decidiu-se, então, que duplas de jovens, supervisionadas por pesquisadoras do imuê e educadoras do GCASC, entrevistariam 3 mães da saudade em cada uma das 13 áreas mais vulneráveis do bairro de Peixinhos, na Beira do rio Beberibe.
Chegamos, assim, juntas, a três tipos de dados a serem produzidos, guiados por frases recorrentemente ditas pelas mães e jovens: “A dor não acaba nunca” – que nos leva a propor a produção de um mapa da dor; “Ele escolheu o caminho das drogas” – que nos leva a questionar a ideia de escolha e mapear os caminhos da exclusão social; e, por fim, “Fazer uma oia”, fazer um “bico” ou um “corre” – que nos leva a buscar mensurar o impacto econômico do luto na economia familiar do bairro.
Referência: Sauret, Gerard Viader (org.). Estatística pela vida: a coleta e análise de informações criminais como instrumentos de enfrentamento da violência letal. Recife: Bagaço Design, 2012.